Quando o paciente não encontra médico no hospital ele o procura no fórum. E acha. Inúmeras são as decisões judiciais, liminares ou definitivas, que mandam o hospital atender alguém, mesmo que este não pudesse utilizar os serviços prestados pelo estabelecimento por algum motivo.
Restrições contratuais, carência, não credenciamento, falta de médico, de leito, de equipamentos, ausência da especialidade e outros fatores não impedem a emissão da ordem judicial para atendimento imediato do paciente. Não está errado, mas também não está certo. Tudo depende do ponto de vista que se emprega na análise da situação, dos instrumentos jurídicos que foram assinados pelas partes envolvidas e das atribuições e responsabilidade do Poder Público.
É claro que se deve evitar mal maior ao paciente e tentar salvar a sua vida. Mas isso nem sempre é possível e o paciente vai a óbito. De quem é a responsabilidade por tal acontecimento? Eis enorme problema a ser enfrentado por anos a fio no Judiciário, visando a identificação do culpado. E é certo que todos os réus terão explicações jurídicas para tentar se livrar da condenação.
Nenhuma autoridade judiciária vai correr o risco de ser responsabilizado pela morte de um paciente, no caso de ela negar liminar. Ação judicial minimamente instruída com documento que indica a imediata necessidade da prática de conduta médica para salvar a vida do paciente certamente terá a liminar deferida. E os custos disso desta intervenção indevida do Judiciário no operacional dos hospitais? Todos conhecemos a via crucis que deverá ser trilhada para o recebimento de tais despesas;
Cabe a outro poder, o Executivo, criar condições eficientes para atendimento das pessoas. É o que manda a Constituição Federal (art. 196) e várias leis infraconstitucionais (8.080/90, por exemplo). Todavia, a realidade brasileira é outra: os hospitais privados atendem a 54% dos usuários do Sistema Único de Saúde nas suas dependências; mais de 70% dos estabelecimentos hospitalares pertencem à iniciativa privada.
E a atividade da iniciativa privada deveria ser complementar (CF, art. 199). Não é. A exceção virou regra há décadas e a complementariedade virou substituição. Isso não vai mudar a curto e médio prazos.
As entidades que conseguirem contornar o seu déficit crescente sobreviverão. Algumas padecerão. Outras conseguirão um paliativo governamental, fato que será transformado em marketing pessoal do benfeitor. Um jeito será dado aqui e ali e a vida continuará. É assim que acontece por aqui.
Os juízes continuarão sem saída e seguirão concedendo liminares para o atendimento de pacientes. Os planos de saúde continuarão com suas posturas restritivas, legais e ilegais. E os pacientes continuarão a ter que “se virar” para permanecerem vivos. E assim vamos vivendo sem solução efetiva, sem planejamento técnico, mas valendo-nos de paliativos gerenciais e improvisos jurídicos que têm data para acabar, mesmo diante do fato de que a assistência à saúde deve ser contínua, como mandam as normas legais.
Como resolver essa situação? Com a aplicação de conhecimentos técnico-científicos da ciência da administração, com profissionalismo, boa vontade política e dinheiro. Ou seja, tudo o que não temos.
Cada um de nós deve contribuir com o melhor de si, de forma convergente, na mesma direção e que esta seja a certa. É o que temos para o momento.