A ignorância é um dos males mais perniciosos da sociedade moderna. O ignorante é aquele que desconhece a existência de algo ou que não está a par de alguma coisa. Muitas pessoas podem ser enquadrados nesta conceituação, inclusive algumas que ocupam cargos públicos de destaque.
Ninguém sabe das coisas. Mas pode-se aprender e minorar a ignorância em relação a elas. O quanto se atenuará da ingenuidade excessiva dependerá do grau de dedicação que o interessado demonstrar. Em qualquer área do conhecimento é assim.
E com a filantropia não é diferente. E nem poderia ser, pois é um assunto árido, complexo, técnico, que possui enorme apelo político e social e serve de instrumento de perpetuação do ignorantismo, quando utilizada de forma nociva e desvirtuada por débeis da nossa sociedade estereotipada.
Além de todos estes adjetivos, e desafiando esta lógica, a filantropia é algo necessário, presente, sentida e conhecida no cotidiano dos menos afortunados, destinatários que são de ações promovidas por particulares imbuídos de amor e generosidade para com os outros.
Os brasileiros definiram que a filantropia, na sua significação macro, é um direito social dos cidadãos, ao escrever a assistência aos desamparados no texto da Constituição Federal (art. 6º.), da mesma forma que o trabalho, que lá também aparece com o mesmo status. E foram os brasileiros que definiram que a assistência social tem por objetivo, além da proteção à família, à maternidade e o amparo às crianças e adolescentes carentes, a promoção da integração ao mercado de trabalho.
E se os brasileiros quiseram assim, por meio da Constituinte de 1988, não será nenhuma autoridade menos preparada que poderá firmar o contrário.
A assistência deve ser promovida pelo Estado, enquanto nação. É para o custeio dela que todos nós pagamos impostos. Todavia, a história registra a incompetência do Estado em assim agir. E é a mesma história que memoriza o trabalho exitoso de entidades sem fins lucrativos constituídas há décadas (algumas há séculos) no atendimento dos carentes de ações que promovam a sua inclusão, sob as suas mais diversas vertentes. É (ou deveria ser) por meio da conjugação de esforços entre o Estado e a sociedade civil organizada que os brasileiros deveriam ter os seus direitos sociais minimamente assegurados, inclusive a assistência e a integração ao mercado de trabalho. Parece fácil e óbvio. Mas não é. Há percalços inacreditáveis neste caminho.
A aproximação entre o Estado e a sociedade nasceu formalmente em 1935, com a edição da Lei n. 91, ainda em vigor, que prevê a possibilidade de declaração de utilidade pública de associações e fundações constituídas para servir desinteressadamente a coletividade. De lá para cá, muita água rolou por debaixo desta ponte e hoje temos uma teia complexa de regras jurídicas que normatizam este relacionamento.
As leis brasileiras não são nenhum primor de técnica, nem de clareza, pois as pessoas que as fazem não são passíveis de serem bem adjetivadas. Para complicar, uma vez posta a legislação, as pessoas resolvem interpretá-la sem utilizar as técnicas de hermenêutica e, a partir daí, editar outras regras, mais malucas ainda, que às vezes extrapolam os limites legais e constitucionais, visando normatizar o relacionamento entre o Estado e as entidades. É fácil prever o resultado.
Se algumas autoridades ignorantes não atrapalhassem, já seria uma grande ajuda.
março/2011