Não é de hoje que nós, profissionais atuantes no Terceiro Setor, somos chamados de “pilantrópicos”, às vezes com todas as letras, às vezes indiretamente.
O Terceiro Setor é composto por homens e mulheres que abdicam de prazeres individuais e se doam em prol do exercício de atividades que visam trazer bem estar e um pouco de alento ao próximo desfavorecido. Em alguns casos, as pessoas contam apenas com esta boa vontade, já que as ações do governo, seja ele qual for, são utopia, para não dizer embromação.
E o que essas pessoas ganham com isso? Críticas impiedosas, artigos desairosos e dossiês que exploram apenas um lado da questão, em afronta ao princípio básico do contraditório e da informação sobre sua versão dos fatos.
A importância e necessidade da mídia são inegáveis. Muita coisa só aconteceu no País por causa dela. Sua liberdade não deve ser tolhida, mas freada pelos limites legais, punindo-se exemplarmente os abusos, que invariavelmente acontecem. Mas porque será que em determinados assuntos ela age como abutre em busca da carniça e usa o tapa olho do burro? Será que ela não consegue imaginar o alcance do desserviço que presta à população quando expõe apenas casos de vagabundos que aproveitam benefícios concedidos a um segmento para tirar proveito próprio? Será que a mídia não mede o impacto negativo que tais informações (as más) causa nos escassos financiadores de projetos?
Pessoas biltres existem no nosso meio. Mas não é nosso privilégio. Todos os setores da sociedade convivem com gente vil e desprezível. As pessoas abjetas são minoria, mas adquirem força e exposição tais que a esmagadora maioria de gente do bem é atropelada por alguns seres canalhas e de má qualidade. É apenas esse lado maléfico que tem espaço nos meios de comunicação. Você se lembra da última vez que abriu o jornal e viu reportagem que trazia os relevantes serviços prestados à população por uma entidade sem fins lucrativos? Em contrapartida, as que descumprem a legislação e utilizam títulos e qualificações em prol de objetivos menores são manchetes de jornal. Qual jornalista é simpatizante à nossa causa? Qual move alguma “palha” para nos defender? Se existe algum, ele está prevaricando, pois ainda não mostrou a sua cara. Talvez seja momento de fazê-lo.
Aliado ao ataque covarde da mídia, que só vê o lado mau do Terceiro Setor, está o governo, em todos os seus níveis, que é apático, estóico, insensível e que está sempre em estado de esmaecimento, em todos os sentimentos, numa ´passividade alucinante´. E o pior: não importa a sigla que “comanda”. As ações (ou omissões) passam de geração em geração, de mandato em mandato, devendo as entidades, como sempre, “se virar” para sobreviver, tentando driblar a voracidade arrecadatória da “Viúva”, gastando o dinheiro que não têm com advogados para buscar sobrevida no Judiciário. Eu poderia exemplificar esta sanha incontrolável de várias formas, mas a insistente alegação do INSS, no Judiciário, da “inexistência de direito adquirido” das entidades em relação a determinados assuntos já consagrados coroa essa fúria governamental suficientemente.
Ora, já que o Terceiro Setor é usado como covil de malfeitores, no pensamento dos cínicos, ameaça a sustentabilidade financeira do País, é pernicioso, fraudulento, sendo tão atacado e não reconhecido, a não ser por quem dele se beneficia, porque então o presidente Lula não edita uma Medida Provisória, que ele tanto gosta e utiliza (média mensal de 5,5) e decreta o fim das entidades do Terceiro Setor, ao invés de tentar engoli-las pelas beiradas, com decretos libertinos, instruções normativas gozadoras, ordens de serviço devassas e resoluções incoerentes? Pouparia tempo de todos.
Se o fizer, onde o governo atenderá as pessoas que precisam de assistência médico-hospitalar se as 2.500 Santas Casas que atendem 42% dos pacientes do SUS fechassem? Onde nossos filhos estudarão se escolas e faculdades filantrópicas, cujas competências são reconhecidas nacionalmente e onde alguns políticos se graduaram, deixassem de existir? De quem os deficientes físicos e mentais receberão apoio para viver se as APAEs, AACDs e tantas outras entidades que a eles se dedicam cerrassem suas portas? Onde as crianças ficariam se as creches mantidas por entidades sem fins lucrativos encerrassem suas atividades? Onde os pais deixariam seus filhos para trabalhar e conseguir pagar tributos aos entes políticos e seus tentáculos, tributos esses que lhes consomem três meses por ano de salário?
Desafio o governo a assim agir e decretar o fim do Terceiro Setor, ao invés de, agindo com macaqueação e com falta de arrojo, utilizar subterfúgios ilegais e contínuos, cessando de uma vez por todas a masturbação social de idéias prosaicas que sabe ser inviáveis, que são “pensadas” por pessoas ignóbeis distanciadas da realidade brasileira, que copiam legislação de países de primeiro mundo e se esquecem (ou fazem de propósito?) que somos do terceiro, com viés de baixa.
O Brasil precisa de gente que faz, como dizia um comercial. E que faz bem feito. Estamos fartos de sermos dirigidos por gente improvisada e pífia que é alçada à condição de mandatário por questiúnculas menos nobres e que lá estão por acomodação política.
Quando será que essa pouca vergonha cessará? Ao que parece, daqui a muito, muito tempo, se levarmos em consideração o naipe de nossos “governantes”, que fazem da política um balcão de negócios despudorado e libertino. Há um ditado que sempre vem ao pensamento e me arrepia: nada é tão ruim que não possa ficar pior. Essa parece ser a tônica governamental, a julgar pelo que vimos nos últimos anos.
Que Deus continue velando por nós! Sempre! Se Ele desistir, será nosso fim.
Oxalá as pessoas de bem não esmoreçam nunca, pois são em maior número, mais inteligentes, mais eficientes e mais úteis ao seu semelhante!
Infelizmente, são desorganizadas. Isso precisa ser mudado urgentemente, sob pena do endividamento impagável e da conseqüente extinção do Terceiro Setor.
Josenir Teixeira
Artigo escrito em 12.01.2004