O assédio e a ameaça dos Conselhos Regionais
Os hospitais sempre estão às voltas com o assédio dos Conselhos Regionais de algumas profissões que insistem em tê-los registrados em seus quadros. Como exemplo, os Conselhos Regionais que mais atormentam os hospitais são: o de enfermagem, o de farmacêuticos e o de nutricionistas. Vimos, também, o Conselho Regional dos Técnicos em Radiologia pleitear tal registro.
Tais Conselhos Regionais insistem em enviar cartas informando, segundo seu entendimento, a obrigatoriedade de se registrar o estabelecimento hospitalar perante aquelas autarquias. Em tais correspondências, o hospital é, inclusive, ameaçado. Dizem elas que, caso o hospital não providencie o registro perante aquele Conselho Regional, o respectivo valor da anuidade cobrado será inscrito na dívida ativa e que será objeto de execução fiscal.
Ousamos dizer que a única intenção de tais Conselhos Regionais é, na verdade, receber o respectivo valor da anuidade.
Todavia, não devem os hospitais sucumbir às ameaças perpetradas naquelas correspondências.
O hospital deve ser registrado única e exclusivamente perante o CONSELHO REGIONAL DE MEDICINA do respectivo Estado onde se localizar.
O embasamento jurídico
Diz a Lei 6.839/80:
“Art. 1º – O registro de empresas e anotações dos profissionais legalmente habilitados, delas encarregados, serão obrigatórios nas entidades competentes para a fiscalização do exercício das diversas profissões, em razão da atividade básica ou em relação àquela pela qual prestem serviços a terceiros.” (grifos meus)
Portanto, podemos afirmar que é a atividade básica da instituição que define o competente registro perante o respectivo Conselho.
Ora, a atividade básica desenvolvida pelos hospitais é justamente a hospitalar, que relaciona-se com a medicina. Assim, é devido o registro apenas e tão somente perante o Conselho Regional de Medicina (CRM), devendo haver a anotação de que o responsável técnico por aquele estabelecimento hospitalar é o Diretor Clínico ou o Técnico, dependendo do caso.
A jurisprudência
Pela simples leitura do texto legal acima mencionado, conclui-se o óbvio: que o registro do hospital somente é obrigatório perante o CRM.
Todavia, não satisfeitos com isso, Conselhos Regionais de outras categorias já bateram às portas do Judiciário na ânsia de ver os hospitais obrigados a efetuar o registro perante (também) aquelas autarquias.
Entretanto todos tiveram sua intenção devidamente rechaçadas.
Citamos alguns julgados, que, por si só, esclarecem a matéria ora tratada:
“ADMINISTRATIVO – CONSELHO REGIONAL DE ENFERMAGEM – REGISTRO. I – Descabe exigir registro de hospital devidamente registrado no Conselho Regional de Medicina, também no COREN. Da mesma forma, não está sujeita à fiscalização deste Conselho.
II – O critério definidor de obrigatoriedade de registro de empresa e da anotação dos profissionais legalmente habilitados, delas encarregados nos conselhos de fiscalização das profissões, assenta-se na atividade básica da empresa ou firma-se em relação à natureza dos serviços que a empresa presta a terceiros. Lei nº 6.839, de 30.10.90, art. 1º.” (TRF 1ª Região – Minas Gerais – Apelação Cível nº 94.01.02722-2)
“REGISTRO PROFISSIONAL – CONSELHO REGIONAL DE NUTRICIONISTA – EMPRESA COM ATIVIDADE BÁSICA LIGADA À MEDICINA – INSCRIÇÃO – DESOBRIGATORIEDADE. Administrativo. Conselho Regional de Nutricionistas. Empresa. Inscrição. Finalidade não ligada à nutrição e à alimentação. A empresa, que tem sua atividade básica ligada à medicina, não está obrigada a inscrever-se no Conselho Regional de Nutricionistas.” (Ac. un. da 3ª T do TRF da 1ª R. – REO 95.01.25945-5-PA – Rel. Juiz Tourinho Neto – DJU 2 16.11.95, p. 78.544 – ementa oficial)
“AÇÃO ORDINÁRIA – CONSELHO REGIONAL DE FARMÁCIA – EMPRESA DEDICADA À PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS MÉDICOS – NÃO OBRIGATORIEDADE DA INSCRIÇÃO. Somente as pessoas que têm por finalidade o desempenho de atividades farmacêuticas específicas, tais como a manipulação de drogas, estão obrigadas a filiar-se ao Conselho Regional de Farmácia.
A Autora (Casa de Saúde Natal S/A) tem sua atividade básica, bem como a prestação de serviços à comunidade, incerta no que podemos chamar de assistência médica, de modo que a obrigatoriedade do seu registro somente será exigível pelo conselho fiscalizador da atividade médica, a teor do art. 1º da Lei 6.839/80.” (Ação ordinária nº 95.0010519-5 – 3ª Vara da Justiça Federal do Rio Grande do Norte)
O SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA já se posicionou de forma definitiva sobre a questão:
“HOSPITAL – ENFERMAGEM – REGISTRO. Embora exista prestação de serviços de enfermagem em hospital, não é esta a sua principal atividade. Agravo improvido.” (STJ, 1ª Turma – Agravo Regimental no Agravo de Instrumento nº 165.007 – DF {97/0076963-1}, julgamento: 19.02.1998.)
Deste julgado, destacamos o voto do Sr. Relator MINISTRO GARCIA VIEIRA:
“… Não se cuida de empresa que preste serviços de enfermagem. O caso é de hospital, que pratica a medicina, segundo os autos dão conta, de natureza curativa, cujos profissionais são médicos. Como não podem executar as tarefas sozinhos, agregam profissionais diversos, tais como atendentes, telefonistas, motoristas e também enfermeiros. A junção dos profissionais não obriga o registro da empresa em diferentes Conselhos …
… o artigo 1º da Lei nº 6.839/80 só obriga ao registro as empresas e os profissionais da área que executem as tarefas a sejam as atividades básicas ou aquela pela qual prestam serviços. No caso concreto, trata-se de hospital, onde embora existe a prestação de serviços de enfermagem, não é esta a sua principal atividade. Sua atividade básica é a prática de medicina.”
Conclusão
Como se vê, os julgados são bastante claros em repelir a intenção ilegal dos Conselhos Regionais, que não o de Medicina, em ter os hospitais registrados em seus quadros.
Ressalte-se, por oportuno, que o SINDHOSP obteve liminar da Justiça Federal de São Paulo que desobriga as suas entidades associadas de efetuar registro perante o Conselho Regional de Enfermagem e Conselho Regional de Farmácia. (1ª Vara, proc. nº 97.0041565-1 e 7ª Vara, proc. nº 94.0024374-0, ambos Mandado de Segurança).
Assim, necessário se faz que os hospitais, caso sejam solicitados a fazer sua inscrição perante Conselhos Regionais diferentes do CRM, questionem judicialmente tal pretensão, visando fazer jurisprudência favorável e evitar que tais estabelecimentos sejam alvos constantes e frágeis de intenções ilegais.